
Eterno embate
- Agora o que fazemos nós, a porta da vida é estreita. Lado a lado somos sombra que é sobra. Separados talvez tenhamos alguma chance. Mas é por demais dolorosa esta extirpação.
- Extirpação? Falando assim até parece comigo, não é por acaso que nos confundem com a mesma pessoa que anda por aí. Mas somos diversos, desde a estrutura morfológica à psíquica. É certo que não pode um viver enquanto o outro ainda respirar. Talvez este seja o único procedimento cirúrgico sem risco: pois o mundo não precisa de palavras e sim de vidas.
- Desumano! Dissimulas a vida à somente carne e sangue! Como podes dizer-se amante da vida, se ignora o homem como ser completo. Estás tu muito obstinado a dissecar, selecionar e classificar, as partes do homem. Pegue todas essas entranhas e junte-as! Eis aí o ser humano.
- Como teu discurso é tolo amigo das letras. Claro que não desfacelo o homem, mas até você tem que aceitar, porque é a verdade que independe de você: as células, os órgãos, os sistemas, ficam doentes e esses que curamos. E o que tua pena se propõe a fazer? Vejo-a apenas comodamente anestesiar a morte.
-É vão continuarmos este diálogo, mesmo que sonhe com nossa convivência. Juntos seriamos incríveis. E algo no mundo seria diferente por nossa causa. O mundo com nossa ausência não seria o mesmo. Juntos saciaríamos nossa vontade afim de fazemos diferença. Então nos separemos. Salvarei vidas com a palavra e tu com a navalha. Não sei os outros, mas não anestesio a morte, e sim injeto a vida.