nAdA AindA

BLOG NÃO EM TESTE... "A CADA DIA QUE VIVO MAIS ME CONVENÇO DE QUE O DESPERDÍCIO DA VIDA ESTÁ NO AMOR QUE NÃO DAMOS, NAS FORÇAS QUE NÃO USAMOS,NA PRUDÊNCIA EGOÍSTA QUE NADA ARRISCA, E QUE, ESQUIVANDO-SE DO SOFRIMENTO, PERDEMOS TAMBÉM A NOSSA FELICIDADE." (CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE)

SEUS OLHOS

- Ela sabe de tudo, não preciso falar... Não fará diferença eu falar.
Então os dois amigos, sentados no banco da praça, um sem olhar para o outro, ficaram fitando a paisagem em volta. O horizonte não era tão infinito quanto a praça em sua frente; na verdade qualquer praça é sempre um horizonte de outro horizonte...
- Não fará diferença você falar... - sussurrou o outro degustando a conveniência – Já que é assim vou te pedir um favor.
Nada respondeu, apenas tirou os olhos da praça e ficou olhando o amigo a explanar...
- Nós crescemos aqui, viemos aqui com frequência. Podemos dizer que somos igualmente cumplices desse lugar. Então a descreva para mim.
Achou estranho o pedido, mas assim o fez:
- Bom, gosto muito do chão da praça nessa época do ano, especialmente ali próximo da fonte com o Neturno de Mármore – os dois Ipês foram cinematograficamente plantados um de cada lado da fonte, de um lado o roxo, do outro, o amarelo; quando éramos crianças a fonte parecia estar abraçando as árvores, tomando de conta, sabe?! Hoje as árvores cresceram tanto que aprofundaram-se uma na outra por cima da fonte, é a vez delas de tomar de conta da fonte - falou iluminando um sorriso puro e breve.  É nessa época que ambas florescem, já notou como uma parece esperar pela outra para florescer?! Sempre juntas. Perfazem um arco amarelo-roxo florido sobre a fonte. Fico observando cada flor que cai lentamente na água... Não afundam logo, são nossos embarcações, o meu sempre fora roxo. E você nuca quis o amarelo, então brigamos para ver quem era o capitão de nossa purpura embarcação... – A voz foi definhando até que sumiu. Observa os olhos do amigo silenciosamente tateando sua descrição – pois é... Essa é nossa praça!
 - Não amigo, essa é a praça sua.

Fabiano de Andrade
12 de dezembro de 2013





“NOSSA LIBERDADE É O QUE NOS PRENDE”


Não é que eu não creia, ou creia, ou ainda, creia mas esteja sobre o muro. Em íntima assembleia comigo, em cáustico anseio em traduzir-me – pois ouvidos desconhecem a língua do inefável, da angustia sensação, sentimento que é água pura em vaso translúcido, que afim de tornar-se visível há de tingir-se de palavras – achei meu coração bombardeando, transpirando, sangrando minha alma. Minh’alma possui asas de tudo e de nada, ou melhor, de tudo-nada: o bater desse movimento sopra desejo, que faz tufão parecer brisa, oceano ser gota, sopra liberdade... Liberdade não é o vão fazer tudo, não é voar em todo o céu; liberdade é estar numa gaiola de porta aberta...

Fabiano de Andrade

01 de Novembro de 13


ENTRE A GÊNESIS E A RESILIÊNCIA

Exatamente isso, não se engane – infame! Nunca serás de você que falo, ainda que fale, minto! Pois não há mais falso do que pensar que autor algum parca segundo de existência a escrever sobre outrem senão ele mesmo. Mas aqui eis a explicação do fenômeno do reconhecimento, da cumplicidade da plateia que ri da piada. Se te reconheces é pela lástima divina de ter pouco barro no Gênesis. Somos Ab Ovo condenados pelo desvio de verba e pelo corte orçamentário, estes nos condenaram a um socialismo da material primordial: divisão e aproveitamento a todo custo de barro! Nada é exclusivo; não há posses. Do barro do coração de uns foram feitas as mãos de outros e os pés dos restantes; aí entende-se por que alguns têm vossos corações nas mãos e outros vivem a pisar o mesmo. Colocou-se um pouco mais de água no barro e fez-se o estômago, então aproveitou-se e fez-se logo a boca, pela ligação lógica de tais componentes, mas sobrou barro... e com este restinho moldou-se os olhos dos famintos. São essas criaturas que desejam tudo o que os olhos alcançam e nunca estão satisfeitos. Denunciou-se logo a falta do fígado; raspando o barro, fez-se este da fina camada de sujeira que residira no chão celestial. Mas se há verdade, ou verdades, uma delas é: entre os vãos, da unha e do chão, sempre há restos - de barro ou mágoas - que precisamos extirpar. Então nas reminiscências do hepático barro, pegou-se os homens, deitaram-lhes no chão, e rolaram de lá pra cá, de cá pra lá... uma empanado de homem, barro de rosca encapando o homem com o que se chamaria pele. Puxando dali, raspando de cá todos os homens cobriram-se com tal pele hepática.  Procedência essa de sermos cobertos de tanta vaidade e tanto orgulho: irmãos siameses.

Babozeira metafórica e introdutória o escrito e lido até aqui; esqueçam caso queriam algo que valha a real ponderação eis:

Desimportante é o barro que te compunha, todos sempre irão querer culpar alguém: descobrirá, cedo ou mais cedo ainda, que alguém tem o teu coração nas mãos. E quão dedicara-se, quão dera atenção a este, que segura teu coração – ainda que com dedos leves, fazia um apenas exercício fisioterapêutico com ele, como bolinha de borracha a entreter. E quão tu jubilava-se com a menor atenção – um olhar? Que vá, um olhar! – dado por tal dono cardíaco teu.

O que me importa a cor do barro de tua composição? Sei também que tão inevitável quanto encontrar portas fechadas no caminho é o fato de que enquanto dedicava-se, chamava, clamava, implorava pela atenção e amor, -  todos notaram teu olhar desejoso, não te preocupes! – buscava como estrela no céu a ser alcançada, teus pés, assim sem querer, pisava uma estrela do mar. Pois teus pés foram feitos do mesmo barro de um coração que ignoras por completo. Quem diria, pobre vítima!, que enquanto corrias com a mão estendida pateticamente a fim de alcançar aquele que tem teu coração nas mãos, cada passo, cada pisada era no coração despercebido.  Quanto mais corres em direção daquele que nenhum valor te dá, tu és sustentada por um coração que sangra em teus passos, e dilacera-se no caminho. Mas não se preocupe em olhar para trás – Eia, olha tua estrela à frente! Avante! – atrás, um rastro que não se sabe se barro, coração, sangue...

E aqueles que estão na busca, mesmo se desconfiarem que a busca é inútil, adoram se enganar e correm, adoram correr – pulmões inesgotáveis - e amam desgastarem-se em frangalhos. Amantes da dor, do “dedo na ferida”, masoquistas... Não cansam de ouvir o corvo grasnando “Never More! Never More!”, e continuam perguntando, mesmo já sabendo a impassível e inevitável resposta! Inventores de suas quimeras...

Necessário notar nos necrológicos parágrafos anteriores um clico. Mãos, não lamentem os corações; corações, não lamentem os pés: Não há culpados! João não é culpado por se mudar para os EUA, nem Tereza por entrar no convento, nem Raimundo ou Joaquim por suas mortes, nem Maria por ficar para tia, nem muito menos Lili e o dissonante J. Pinto Fernandes por serem felizes. E não se sinta culpado por querer culpar Deus em teus sentimentos mais íntimos. Às vezes não há culpados, a ciranda que é de pedra.

Seja todo e qualquer barro, estômago sempre tem um limite, mas mesmo cheio uns querem mais. Os que têm estômago na boca se alimentam até a tampa e ao fim ficam tristes por caber tão pouco; muito que é pouco, muito pouco, dizem. Pior ainda os olhos de estômagos, enchem-se e não param de desejar – o desejo nasce nos olhos! – os olhos percorrem a terra, mas sempre desejam, famintos, o horizonte. E nunca lembram, não importando onde estejam, que onde pisas é sempre um horizonte de outro lugar – E sofrem de insatisfação crônica, eternamente com olhos famintos dão “pouco valor ao muito que têm, e muito valor ao pouco que lhes faltam”.  

Toda pele precisa de sol, necessidade divinamente dissimulada pela sobrevivência. Nós somos o a vela que não suporta esconder-se embaixo da cama ou no candeeiro; vaidade de mostrar-se, publicar-se. A felicidade é um riso menor se não houver plateia, o mesmo vale para as lágrimas. E orgulha-se converte-se tudo em espetáculo. A pele, que é bílis, exige o mundo exterior. O equilíbrio arquitetado pela Natureza é o fato do barro endurecer ao sol. Ao passo que ganha dureza, ganha também a capacidade de quebrar-se. Sublime ironia... O orgulho fortifica e enfraquece, alimenta e envenena, enrijece e nos torna quebrantáveis.  Irresistível não admirar - com sorriso malicioso – a ambiguidade da condição do cavaleiro vaidosamente guarnecido em muralhas impenetráveis. Paredes e pele; barro, barro e orgulho. De fora para dentro, proteção; de dentro para fora, solidão.

A vida nos exige um contrato, contrato de resistência, contrato de resiliência, contrato do “apesar de”, o contrato da inocência e coragem, um contrato que não passa a mão em nossas cabeças. Necessário olhar um horizonte sempre, - adaptar-se, inventar-se, ressuscitar – olhar um horizonte que por vezes está sobre nossos pés.

Que lástima! Falei “nossos”, falei de ti; perdão, quis falar, meus pés!


Fabiano de Andrade
11 de junho de 13,
em um retorno, saudoso e exigente.



COMPLEXO DE ÁLVARO

Cheguei ao ponto de conhecer-me tão bem que digo apaixono-me só quando quero; afirmo conhecer-me tão bem que conheço o outro, pois o outro que delatamos com tanta acuidade é senão nós mesmos – como todo  conselho que ousamos dar: apenas espelho que se recicla; cheguei  a tal conhecimento que sinto orgulho, medo e pena de mim mesmo. Tornei-me tão senhor de mim mesmo ao ponto de ferir o outro idoneamente, para lhe fazer bem maior; Ser consciente e entreter. Ser consciente e manipular, e machucar o outro por achar que te pagava dívidas, enquanto ninguém te deve nada!  Enfim, machucar por não saber sofrer. Tanta autoconsciência passei a possuir, que me escaparam as fendas, onde perpassa sorrateira a vida, o não dito, o silêncio e o mistério, que é penumbra. Estive tão consciente da minha consciência que foi impossível olvidar, quando tudo, não o que queria, mas o que precisava, era esquecer.
Fosse contar a história desse sabichão, começaria assim: Era uma vez um homem, dono absoluto de todos seus sentimentos... que certo dia conheceu uma Carmen, de véus e olhares que muito lembravam certa ópera...

Fabiano de Andrade
26 de junho de 2012




 OÁSIS

Perdoe-me Deus, fizeste-me homem e sabias que eu era fraco. De tantas faces que é do homem há sempre um vértice onde todas elas se tocam: é um esforço sobre-humano manter-se acreditando, manter-se fiel a si mesmo. Somos tão propensos às efusões, derramamentos que nos arrebatam e arrematam, efusões de luz e de sombras, torrentes de vida e de morte que nos vêm diariamente. Manter-se constante as ondas é sermos mais emperdenidos do que as rochas, e nos anos, nem as encostas permanecem intactas. Sou homem, não sou Deus, nem defunto, meu coração ressoa diante de sinfonias por que passo. Nos anos nada, nada se provou tão forte quanto o poder no acreditar; é tão fácil abismar-se, tantos são os socos, bocas e olhares, contrários que nos desejam terrivelmente céticos, brutalmente cínicos, mortalmente insensíveis e desacreditados, amedrontados pela falta de fé, onde nada se afirma nem se nega, só se duvida...
Neste eterno movimento de crença e descrença é sempre preciso reerguer-se, e tanta coisa pode ser o ponto de apoio, há sempre, sempre uma mão estendida a ser descoberta ou inventada. Inúmeras vezes já voltei a olhar para cima, submergir como quem sai de um mergulho profundo onde quase se afogou e busca um infinito fôlego, todo o ar do mundo para tão pequenos pulmões. Os amigos são uma forma de tocar o divino; Hoje, em dias cinzas, encontro outra mão, outra razão a ressuscitar e fortaleço  meus outros motivos. Poderia citar alguns amigos, que talvez nem saibam que o são, mas gosto de fazer tesouros particulares, únicos, - ilhas só nossas, como minha mania de renomear cada um. E este pertence à pessoa que me falou em SMS: 

“Tava lendo “EM MEUS HÁ MARES” Lembra? É muito perfeito! Sempre que leio fico pensando com a certeza que perfeição existe, é sério! Bjo! Com saudade! :)”

Provavelmente essa pessoa falará entre dentes: DISgraçado, publicou meu SMS” e depois, com voz de guria chorona “aiii que vergonha”. Suzanne Guimarães, apesar de ser a pessoa que nunca concorda comigo “onde o poema deve acabar” e sempre relutar em dá opiniões “por não entender nada disso tecnicamente”, é alguém que acredito profundamente na intuição natural e sensibilidade que se expressa em exasperações, gestos de mãos e faces. Ao fim percebo que tudo funciona de modo simples: é  acreditando nas miragens, nossas ou alheias, que ao fim nos pegaremos corados e nadando em piscinas naturais de nossos oásis. Amigos são aquelas pessoas que fazem nossas loucuras fazerem todo sentido; e em verdade digo, dou razão a cada louco, e vice-versa...
 
Fabiano de Andrade
23 de Maio de 2012


SOFISMAR

Não querida, não posso ficar admirado
Com o lindo resultado deste brincar...
Já que findo, digo: os dados do cupido são viciados.

Mas espantado - Sim! - fico com o teu proceder.
Que escola é essa onde aprendeste tão bem
Que deves afastar-se de tudo o que é profundo?!

Quão fecundo foi o entreter de teu mundo:
O ir e vir da mesma moeda,
Euforia e alegria
Vivaz, ser tudo, viver tudo!
Voraz, devorar a paz.
Doses letais, aliás, desiguais...
Liberdade torrencial, pervicaz.
O que se quis devorar?
Manuais:
Cais.
Beirais.
Divinais!
(fugaz; fatais, Ineficazbanais)
Trás e zás!...
...Funerais...

Nos teus maiores funerais estavas cantando.
E o defunto, insepulto, não chorava, não ria, não sentia
Pois nada sabia, nem mesmo que morria!

Mas veja que ironia: querendo nada conquistar,
Por medo de perder
(E lembrar-se por demais do já perdido uma vez)
 fugistes de mergulhos,
Covardemente
E virastes uma afortunada!
Em teu preencher com superfícies vorazes
  – vazias
Nada mais podes perder.
Pois já não tens tua melhor, maior e única posse.

Nadaste em superfícies, e em superfícies afogaste.
Perdeu-se a deriva, nadando na superfície do mar.
Eia esquiva, superfície é face! que tu não tens mais.




Fabiano de Andrade
24 de abril de 2012



SÍNDROME DE BARTLEBY OU POEMA DA DESPEDIDA


O jovem poeta que vivia a perguntar

O parecer alheio sobre os versos seus

Sentenciou-se espantado ao se revelar


Que o maior, melhor: crítico mais severo.

Único a dar ouvidos, abraços e versos

É senão ele mesmo: sereno e sincero!


Então, de tão olímpica ciência poética

A pena esqueceu, nunca mais escreveu!

Dizia com sorriso sério: é questão de ética!


Aspiro uma poética tão majestosa

Como aspira feroz a Vida um suicida:

Na inaptidão vergonhosa, adeus glosa!

Na inexatidão perniciosa, adeus vida!


Ah noção de poesia, porque tão grandiosa?!

Como é a noção de vida para o suicida!

Enfim, interrompeu para sempre o escrever

Como aquele eternamente deixou o não viver!

Fabiano de Andrade

19 de março de 12

COMO MOVER UMA MONTANHA


"Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar."

—Wittgenstein.


Passei horas tentando escrever uma linha sobre eu e você, algo que encaixasse as palavras - e ideias – prudência e amor. Ao fim, o Amor provou-se tão impregnado e tácito, que não descolou centelha alguma em palavra; retenção lírica que não se confunde com inexpressão: conhece o silencioso olhar enamorado? Ou as ações que dizem, que gritam, eu te amo?! Silêncios e ações, os quais só os que têm a chave - olhos para ver, ouvidos para ouvir – que reconhecem. Todo coração empedernido é cego, farpado por dor e receio. E a maior prudência de todas, foi-me o papel que se exigiu branco. Branco de tão puro, ou talvez branco de medo, que por vezes tem a furta-cor da prudência. Deus nos conceda o tão raro dom de discernir cores que nos furtam...

Fabiano de Andrade

21 de fevereiro de 2012


IRONIAS DAS IRONIAS


A Ironia é arma devastadora, lares que poderiam se aquecer com a energia nuclear de uma infantaria. Certo dia enojou-me a ironia - o cinismo que corrói a claridade do peito aberto. Foi quando o humour servil ao algoz dos que se arrogaram por terem uma pedra em mãos e saber como usá-la, e não como elevação de um estado ou de uma ótica. Desgraça dos altivos, fazem dos ombros dos irmãos sua escada. A indiferença é a lei do ironista inveterado; a afetação, sua pena. Não se ama, sinceramente não se ama: ah como não te odeio... Piedade: importo-me tanto com você quanto o mundo... Ironia: quando um ato vira seu oposto, pretensiosamente desejando ser o mesmo ato, porém com maior energia, algo sempre se perde, uma essência escorre de seu negativo. Perde-se no subtendido, talvez não o sentido em si – que é tendencioso - mas o dar-se a cara à sinceridade, a vivacidade de ser puro, de ser inocente, de se ser e só; e não pensar por demais nas conseqüências, em como podemos deste modo nos ferir, sermos frágeis, pois ao passo destes pensamentos, nos abrigamos em um anestésico asilo: e quem nota que a ironia, por vezes é mais defesa que próprio ataque?! Grande peito, finíssima imensidão. Deste modo, a ironia torna-se um maldito verme que destrói a integridade. Assim, se pode ferir, sangrar, matar! pelo simples receio bruto de morrer. Não é cada vida feita de várias mortes em si? Ah morre-se muito para poder-se viver. Mas todos fogem – proteção, manutenção, conservação, covardia –, bem aventurado os que sabem morrer, pois esses estão condenados à vida. Perdão, novamente ironia...


Fabiano de Andrade

05 de Fevereiro de 2012

ABSOLVIÇÃO


Nesse momento em que você veio com uma formidável pedra em mãos, e, do peito transbordando intenções perniciosas, abruptamente engoliu o fel que subia à garganta, pois o outro, de quem esperava reação tão feroz quanto, foi doce, amável e sereno. Aprendi assim, que às vezes a melhor resposta para um grito não é um eco, mas sim um abraço.

Fabiano de Andrade

27 de janeiro de 2012



AMOR-MOR



À Leidiane Pereira; sem verbo.





Amor que faz eco é amor maior, Amor-mor...



Chegamos ao tempo, - nosso tempo – que dizer


te amo, te odeio, não adianta,


tamanha é a traição de nossas palavras


perante a profunda consciência da gente.



Os corpos se desgastam em palavras,


Vocábulos são levianos, leve anos...



30 de junho de 2011



Fabiano de Andrade























O DESRESPEITO

O conheci no café da esquina, só nos restava um pão de queijo. Eu estava atrasada. Ele avistou primeiro o derradeiro pão de queijo, mas fingira que não o queria, deixando-o assim, para mim. Então, entrando na ciranda, eu fingi que não percebi. Mas propus dividi-lo. Eu usava meus óculos escuros, por receio que alguma lágrima da noite anterior ainda estivesse em meu rosto: “Nunca mais amar” fora a minha resolução. Em meio a conversa, tão quente quanto o café, notei sem querer que “a gente corre o risco de chorar um pouco quando se deixa cativar” estava escrito na capa da agenda dele. Em menos de dez minutos nos despedimos, sem menor compromisso futuro. Falei “tchau”, pensei “adeus.” Sem querer me atrasei nos dias seguintes. Quando havia mais que um pão de queijo esperava restar o último. Ás vezes, comprava todos e deixava lá o nosso último. Mas não queria correr o risco de chorar um pouco, não me deixei cativar. Ele me desrespeitou, mas não, não me deixei cativar. Acho que afinal, amor é desobediência mesmo. Por fim, não consegui evitar as lágrimas, nem mesmo no casamento...

Fabiano de Andrade

BALADA DO CORAÇÃO


Meu coração é vasto como o deserto

Dentro de uma ampulheta,

E sua tempestade, areia de alabastro

Dança de lado a outro

Casto, somente quer o bem; a quem?!

Criança a lançar o tempo,

Sobre inocentes; por amar, culpados.

O areal afoga em monte

Sem norte, tais corações ancorados

Sem ponte, em cais distintos.

Tinto menear de se apaixonar; minto?!

Queira oh meu Deus, que tal

Pulsação não seja meu natural

Batimento; violento

Intento de intenso viver – vil fraude.

Coração, não serias

Órgão feito pra bombear sinfonias?

Então, o meu não foi feito

Foi defeito apenas pra bombardear.

Se é assim: é tanto vasto

Quanto nefasto, meu poeril bailar.


Mas há de vir dilúvio, divina ventura

(Brotar no ventre do tempo, semente pura)

Chuva a transformar meu deserto vasto em pasto.

Fabiano de Andrade

16 de abril de 2011

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